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*Por Patricia Punder
Em primeiro lugar, não podemos confundir o direito a se desconectar com alienação. O direito de se desconectar significa não estar disponível 24 horas x 7 dias da semana para o trabalho. Infelizmente, com a pandemia, o trabalho remoto trouxe esta realidade de disponibilidade total à tona.
Por medo de perder o emprego e para demonstrarem mais produtividade por não estarem presencialmente nos escritórios, muitos colaboradores levaram a sério o comprometimento em estarem 100% disponíveis, sem que tivessem qualquer contrapartida de seus empregadores.
As consequências são as mais variadas possíveis como Burnout, afastamento por questões de saúde e até assédio moral virtual contra os colaboradores que tentaram impor limites saudáveis nas relações laborais. Muitas empresas compreenderam que estavam passando dos limites e tomaram providências mediante a implementação de uma política de trabalho remoto e conscientização da alta e média liderança. Demostraram não apenas respeito pelos seus colaboradores, mas empatia em relação aos mesmos.
Outras empresas simplesmente foram mais a fundo nas demandas e criaram literalmente situações do tipo “BIG Brother”. Monitoramento constante dos colaboradores, sem intervalos para ir ao banheiro, questionamentos sobre horário do almoço, prazos de entrega de projetos ou trabalho extremamente curtos, se aproveitando da situação de vulnerabilidade emocional dos colaboradores. Motivo pelo qual, principalmente, nos Estados Unidos, temos um movimento de executivos que não querem mais voltar a trabalhar em seus antigos empregos ou em outras corporações. Querem buscar um motivo ou um proposito para suas vidas profissionais.
Claro que quando pensamos no cenário econômico brasileiro, a grande massa de cidadãos não pode se dar ao luxo de pensar nisso. O desemprego é maciço, os salários diminuíram e o cenário futuro incerto. Quem está empregado paga o preço para se manter empregado, mesmo que custe sua saúde física e mental.
Outro ponto interessante está especialmente relacionado aos jovens, pois para os mesmos não está claro quando eles devem ou não estar disponíveis. Quando um jovem inicia um trabalho em um emprego novo, ele/ela quer ser perfeito e pensa que “se não responder ao e-mail enviado às 22:00 horas, talvez o respectivo chefe não goste”. Então, acredito que uma mudança cultural é mais do que necessária, deve ser um tópico mandatório para todas as empresas e lideranças.
Trata-se de um clichê antigo pensar que os colaboradores trabalham pouco ou estão sempre de olho no horário do fim do expediente. A carga de trabalho aumentou muito e a produtividade também nos últimos 2 anos. O ditado “fazemos mais com menos pessoas” é a realidade atual de muitas empresas ao redor do mundo.
Outros países, como a França e a Bélgica, já aprovaram mudanças substanciais visando garantir o direito dos colaboradores de se desconectarem. O grande debate do futuro deveria ser as vantagens da desconexão dos colaboradores, através de regras claras e conscientização dos líderes das empresas. A desconexão traz vantagens como poder pensar em novas ideias ou inovações, o próprio descanso mental necessário que o colaborador tem direito para poder produzir com mais qualidade e prevenir doenças mentais, que são e serão problemas que serão enfrentados nos próximos anos por muitos países e empresas.
*Patricia Punder, advogada é compliance officer com experiência internacional. Professora de Compliance no pós-MBA da USFSCAR e LEC – Legal Ethics and Compliance (SP). Uma das autoras do “Manual de Compliance”, lançado pela LEC em 2019 e Compliance – além do Manual 2020. Com sólida experiência no Brasil e na América Latina, Patricia tem expertise na implementação de Programas de Governança e Compliance, LGPD, ESG, treinamentos; análise estratégica de avaliação e gestão de riscos, gestão na condução de crises de reputação corporativa e investigações envolvendo o DOJ (Department of Justice), SEC (Securities and Exchange Comission), AGU, CADE e TCU (Brasil).